Muito se fala sobre romantização da maternidade e como seria necessário desromantizá-la. Mas existe uma prática ligada à romantização da maternidade que acaba sem receber o devido destaque: a romantização da infância e das crianças.
Crianças são anjos. Seres puros. Representação máxima da ingenuidade e da inocência. Incapazes de machucar alguém. Desprovidas de qualquer maldade. Dádivas divinas. Bênçãos. Essas são construções que permanecem fortes no imaginário coletivo, e que simplificam aquilo que crianças são ou podem ser.
Tais crenças tornam as interações com crianças muito mais pesadas. Nesse sentido, uma mãe que comete algum erro com o filho pequeno estaria errando com um anjinho, com a imagem encarnada da renovação e da pureza. Do mesmo modo, uma mulher que não se sinta confortável em carregar um bebê no colo estaria recusando ter nos braços uma bênção dos céus. E assim por diante.
Crianças não são seres divinos. São pessoas no início de seu desenvolvimento físico, intelectual, psíquico e emocional. Crianças não são meras esponjas do comportamento dos adultos. Têm agência, capacidade de reflexão e de questionamento. Crianças podem machucar, desafiar, manipular e magoar, inclusive de propósito. Bem como podem construir, ajudar, acolher. Crianças sentem raiva, ciúme, repulsa e podem reproduzir preconceitos.
Achar que crianças são desprovidas de todo e qualquer sentimento ou intenção negativa, em si, já é uma idealização. Isso só não acontece nas mesmas bases dos adultos, já que elas não apenas processam e expressam essas emoções e pensamentos de forma diferente como também não têm total dimensão do que seus atos implicam.
Enxergar crianças de forma menos idealizada ajuda tanto a cuidarmos melhor delas quanto a tornar a rotina de quem se ocupa dos cuidados com elas mais leve e saudável. Afinal, crianças e seus cuidadores são gente.
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Essa e outras temáticas são melhor exploradas no livro “Ser mãe é f*d@!”: mulheres, (não) maternidade e mídias sociais.
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